quinta-feira, 13 de junho de 2013

Seguindo Em Frente


Estávamos deitados em sua cama ainda nus, sentia como se fosse a primeira vez que ficávamos daquele jeito, nos sentíamos completamente vulneráveis. Ela mantinha a cabeça deitada em meu peito, eu sorria para o teto lembrando-me da noite passada.

- Leo, se nós vamos continuar com isso teremos de estabelecer certas “regras”.
- Regras? Como assim?
- Precisamos ser sinceros um com o outro.
- Claro.
- Quer começar?
- Com o que?
- A falar sobre as coisas que nos afastaram ou que não gostamos.
- Tá. Sinceramente? Eu não gosto de nenhum dos seus amigos pé no saco.
- O que? – Ela levantou a cabeça para me olhar nos olhos. – Você nem sequer deu uma chance pra gostar deles.
- Gastei todas as minhas chances nos primeiros fins de semana. Não dá, são todos uns babacas de cabeça pequena que com o primeiro toque diferencial já saem babando nas bolas dos outros.
- Olha como fala! Você nem sóbrio ficava pra conhecer eles
- E tinha como? Aquele papinho medíocre me dava sono...

Respirou fundo.

- Quer saber? É a minha vez. Eu não sei, nem quero saber o que você fez esses meses, só queria te ver antes de ir embora.
- Embora?
- Eu encontrei com o Alex, ele me disse que você iria pra Minas cedo ou tarde.
- É... – Fiquei constrangido com o que viria a seguir. - Eu não vou pra lá.
- Não? Então por que a mudança? Pra onde vai?
- Não vou, eu voltei. Passei os últimos meses lá, estou de mudança por que vou sair do meu velho apartamento pra um lugar onde eu possa me manter limpo.
- O QUE?! E quando iria me contar isso??
- Calma... Eu tentei, mas você mudou seu telefone quando me largou.

Ela me olhava furiosa, eu sorria tentando melhorar o clima.

- Você sabe muito bem por que eu fui embora.

Não tive palavras.

- Você a escolheu, Leo. Não a mim, ela.

Meu sorriso se foi.

- Não podemos estar em um relacionamento se você diz me amar tanto quanto ama ela. Pra ficarmos bem, para o seu bem, você não pode desistir da reabilitação como fez, não pode continuar afastando as pessoas da maneira que passou a sua vida inteira tentando encarnar na alma de um bando de bêbados cheios de sujeira dentro de suas almas.
- Meu bem... – Segurei sua mão. – Eles escrevem para limpar a sujeira. Confie em mim, não sou o mesmo.

Ela sorriu com lágrimas nos olhos, me beijou assim que as lágrimas começaram a escorrer por seu rosto. Fizemos sexo, outra vez, como se fosse a primeira vez juntos. Era magnifico me sentir vivo de novo, minha cabeça ainda estava confusa, mas não deixava que ela pensasse por muito tempo, tinha de usar a outra cabeça naquele momento.

A mesa estava toda arrumada, pratos, talheres, uma taça de vinho, seria um almoço delicioso feito por Mélanie. Nos sentamos, ela sorria para mim, devia estar pensando em alguma das posições que fizemos durante a manhã.

- Então, o que achou? Passei um pouco do ponto?
- Não diga isso meu amor, você tá no ponto, coisa divina!
- Há há, seu bobo, não falei de mim, era da comida.
- Não tão boa quanto você... Está ótima.

Sorriamos um para o outro.

- O que faremos hoje? – Ela me perguntou.
- Estava pensando no que conversamos de manhã.
- E...
- Por que não fazemos assim, saímos com seus amigos essa noite.
- Como é? Você não disse isso só pra me agradar não é?
- Agradar? Já te agradei demais essa noite. – Pisquei para ela que me mostrou a língua.
- Tá bom, se é o que quer.

Terminamos de comer, ela saiu, alguém tinha de pagar as contas, certo?

Sentei no sofá, liguei a tv em algum programa sobre a vida animal, Billy assistia com muita atenção. A cena era épica, eu de samba canção, barriga para cima e a expressão de vazio no rosto, Billy ao meu lado com as orelhas armadas e o olhar fixo para a tela colorida de alta definição. Me dei conta de que precisava sair do sofá antes que meu dia fosse completamente consumido pelo tempo passado.

Ajeitei as folhas de papel sobre a mesa, apontei o lápis e comecei alguns rascunhos em francês. Queria surpreender Mélanie com um pequeno poema. O dicionário era meu companheiro naquela batalha. Como começar? Deveria arriscar nas palavras? Escreveria em português primeiro? Enchi uma taça de vinho, comecei a escrever da maneira mais fácil, brincava com palavras e frases. Consegui - não fui autorizado a publicar o poema.

Já passava das sete horas da noite quando Mél voltou e me surpreendeu, eu estava na janela fumando APENAS o segundo cigarro do dia.

- Leo!
- Oi...
- Você sabe que precisa parar com isso.

Pegou o cigarro da minha mão e jogou pela janela ainda aceso.

- Mél, você sabe que não é fácil. E esse é o segundo do dia só.
- Não importa, eu tô aqui pra cuidar de você. Cadê o maço?
- Maço? Não tenho...
- LEO.

Ela jogou meu maço inteiro no lixo, meu triste pulmão chorava por dentro, meu coração sorria esperançoso.

- Vem, vamos tomar um banho que daqui a pouco vamos sair.
- Opa! – Nunca estive tão feliz para o banho.

Chegamos no bar, luzes neon na porta, nas janelas e no nome de identificação do lugar. Muita gente aproveitando a sexta feira com roupas curtas e double chopp. Sentamos junto dos amigos dela, estavam todos lá. Me encaravam com estranheza, deviam pensar “esse cara nunca vai embora?”, “o que será que ela vê nele?”, “provavelmente tem um membro espetacular, ela é muita areia pra esse metido a poeta.”. Minha imaginação de bosta.

Cumprimentamos a todos, pedimos um chopp pra ela e um suco de laranja pra mim. Ela estava sentada de frente para mim, odiava quando fazia isso, não conseguia brincar com suas pernas por de baixo da mesa. Era uma tortura.

- Memél você não sabe onde a Vanessa anda se metendo. Ou melhor, em que...

Impressionantemente era um homem se dirigindo a Mélanie.

- Nem precisa contar, já sei das histórias dessa “zinha”.

Não iria dar certo, logo no começo da noite e eu já sentia vontade de voltar para casa e me enfiar naquele sofá outra vez. O problema não eram os amigos dela, nem as conversas, claro que a falta de álcool no sangue esquentando meu cérebro e me arrancando assuntos surpreendentes estava distante, mas era a mudança em mim que me surpreendia.

- Não vai tomar uma dose com a gente hoje? – Lucas, um dos amigos dela, me perguntou.
- Deixa pra próxima, hoje eu dirijo.
- E o que tem? Você sempre dirigia bêbado com Mélanie do seu lado.

Desgraçado, queria me tirar do sério com tão pouco? Mantive a calma, ele estava certo.

- É, eu era assim.
- Ei, trás umas tequilas! – Pediram para o garçom mais próximo.
- Tequila! – Gritavam todos juntos.

A vibração como se fosse o gol do título.

Continuaram com conversas sobre coisas que não me atraiam como o sofá da sala ou as pernas escondidas de Mélanie.

- E então Leo, o que fará da sua vida agora?
- O que sempre fiz, correr atrás do que eu quero.
- “Só” isso? Há há, não é fácil né?
- Nunca será, mas a gente vai lutando enquanto ainda sobram forças.
- Boa cara!
- Corajoso você.

Por que ela só conhecia homens? Essa mulher me levaria à loucura outra vez, não me restava dúvidas quanto a isso.

Passamos por longas horas naquele bar, eu não tinha engolido uma única gota de álcool, enquanto ao meu redor todas, inclusive Mélanie, estavam bêbados e a conversa já chegava no seu ápice de embriaguez.

- Leo, vai cara... Acompanha a gente só nessa!
- Vamo!

Olhei para Mélanie, ela me observou a noite inteira, comecei a pensar que ela deveria ter percebido que eu estava mais dormindo do que interagindo de verdade, eu tive de reagir. Todos esperavam a minha reação, principalmente eu.

- É... – Voltei o olhar par ao grupo. – Talvez não seja a melhor hora... – Olhei par a ela, depois para o copo e para o pessoal. – Já está tarde gente, deixa pra lá. – Um sorriso falso.

Tive de carregar Mélanie até o carro, ela, assim como todos naquele bar, estava completamente bêbada. Falava algumas besteiras, eu não entendia absolutamente nada. No carro ela apagou, como mágica, ela sempre dormia quando estávamos no carro em movimento. Era uma graça.

Em casa, é claro, ela sentiu o enjoo, não é fácil assumir a bebida dentro de si. Cuidei dela como se trata um bebê, dei banho, ajudei a por a sujeira pra fora e ouvia coisas sem muito sentido. Ela estava deitada na cama, ainda nua, de costas, meus olhos brilhavam. Como era possível uma pessoa ser tão magnífica? Não apenas seu corpo, mas a paixão que saia dela, toda a graça em seu jeito de ser, meu coração palpitava olhando para a mulher que ia além dos sonhos, ela era real, assim como seus defeitos e suas perfeições.

- Obrigada por ter sido tão bom conosco hoje, você é especial Leo, não se esqueça disso.

Daquele dia em diante eu não me esqueceria disso jamais. Nem sempre na vida de um escritor é preciso carregar apenas dor.

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