sábado, 9 de fevereiro de 2013

Uma Ducha Para Refrescar

- Alô?
- Finalmente! Porra, onde você se meteu?

Abri os olhos de vagar, eu estava deitada em uma pedra, o mar batia contra as pedras e respingava em meu rosto. Uns cinco caras fumavam maconha ali por perto.

- Cara... Eu acabei de me dar conta que dormi nas pedras.
- Pedras? Você tá na ponta da praia?
- Sim.
- Cacete Leo! Por isso você sumiu. Olha a gente tá indo pra ai te buscar.
- Obrigado.

Enquanto eu os esperava, aproveitei para fumar um cigarro e lembrar como eu fui parar lá. Eu lembrei.

- Leo!
- Oi Alex.
- Feliz ano novo cara.
- De novo?
- Eu só queria ser legal antes de pedir um cigarro.
- Idiota. Toma aqui.

Fomos tomar um café na livraria Ponto das Letras. O lugar era ótimo, pequeno, bem receptivo e com uma boa variedade de livros, e até alguns CDs.

- Que graça esse lugar. – Disse Ana.

Nos sentamos. Ana procurava algo diferente e com boa aparência para começar o ano com um gosto diferente em sua bebida.

- Olá, o que vão querer?
- Eu quero um cappuccino frio. – Pediu Ana.
- Três cafés, por favor.
- Faça o meu bem forte.
- Está bem. Volto em um minuto.
- E então, como você foi dormir nas pedras Leo?
- É verdade, depois da virada você e a Nathália saíram e simplesmente não voltaram mais.
- É um pouco tarde pra notar isso. Nós fomos dar uma volta, quando voltamos não conseguimos encontrar vocês.
- Ficamos bebendo por um bom tempo lá, depois eu fiquei cansada e decidimos encontrar um lugar para passarmos a noite.
- Entendo. Bom, depois de ficarmos procurando por vocês em vão decidimos descansar nas pedras olhando o mar. Acabamos fazendo mais do que apenas olhando e bebendo... Depois ela me perguntou se eu queria carona para voltar para casa, eu estava completamente bêbado e disse que não precisava, que eu sabia o caminho de casa. Passaram trinta minutos, ela se foi e eu percebi que não morava aqui.

Eles davam gargalhadas, eu apenas olhava para o vazio no chão.

- Voltei. Três cafés... O do senhor é o forte... Aqui, o cappuccino da moça.
- Obrigado.
- Feliz ano novo.
- Moça? Nossa ainda me vem com essa?
- Pelo menos você não é o “senhor” para cada pessoa que te atende.
- Culpa dessa barba, senhor.

A conversa sobre a noite anterior estava me deixando entediado, fui até a estante analisar a safra de livros que havia ao redor. Muitos da geração Beat, isso me agradava muito. Alguns de Schopenhauer, Anaïs Nin, Freud, entre outros. Me recostei na parede para ler um trecho de “Vagabundos Iluminados”.

Voltei, terminei o que sobrava na xícara de café. Eles ainda falavam sem dar muitas pausas.

- Leo, decidimos ficarmos por mais uma noite.
- Se vocês decidiram o que eu posso fazer?
- Era só para deixar avisado mesmo.
- Que tal irmos tomar um drink? – Perguntou Alex, o salvador.

Deixamos o casal passear pela cidade como dois apaixonados pós-ressaca. Fomos até um quiosque.

- O que querem?
- Uma cerveja, a mais gelada. Dois copos.
- Me da uma dose do que tiver mais forte, por favor.

Eu praticamente suplicava por aquilo, era necessário para dar “inicio” ao meu dia.

- Cara, olha aquele pedaço de rabo.
- Quanta sutileza Alex...
- Porra, ela parece uma conhecida.
- Conhecida?
- Sim, sim. Eu conheci ela em um bar, as coisas esquentaram e a gente foi pra casa. Durante a foda ela de quatro se virou, olhou pra mim e disse “me bate, me chama de vadia.”.
- Como assim... Tá brincando comigo.
- É serio. Eu respondi “posso tá bêbado, mas não faço essas coisas não filha.”. Corto o clima todo, deitei, fumei um cigarro e dormi.

Eu ria da história e ainda imaginava a cena com a garota que acabava de passar.

- Mudando de assunto, e então, o que fará desse ano?
- Tenho de me arranjar em um emprego.
- Você? Milagre.
- Não é tão fácil viver de sonhos como era antigamente.
- Tá certo meu rapaz. Minha meta é aprender a jogar tênis.
- Que porra?!

Ficamos até o por do sol na praia, foi algo realmente bonito de se ver. Estávamos bem alcoolizados e o sol pintava o céu de laranja, víamos apenas metade dele escondido entre nuvens e montanhas. Eu sempre guardava aquelas imagens como se fossem quadros que eu pintava com minha mente completamente embriagada.

Eu precisava de um banho e alguns minutos de descanso, o casal precisavam de uma cama e Alex também, ele não se aguentava mais em pé. Fomos para um motel.

- Puta merda! Era exatamente o que me faltava...

A água batia suavemente em meu rosto, escorria do pescoço e descia por todo meu corpo, eu me sentia em uma cachoeira do alivio, deixava a água lavar todo o mal. Meu celular tocou.

- Porra! Deixa essa merda tocando.

Após meu banho tranquilizante o celular voltou a tocar, dessa vez eu atendi.

- Alô?
- Leo? Oi, é a Nathália. Eu queria saber se você esta bem.
- Oi! Sim, estou perfeito, acabei de sair do banho. Finalmente estou sorrindo.
- Que gracinha. Vai voltar hoje?
- Não, decidimos deixar para amanhã.
- Por que não damos uma volta pela vila?
- Adoraria.

Nós encontramos no píer. Sentia uma sensação muito boa e tranquila, apesar da movimentação dos pescadores e dos turistas. A iluminação era muito diferente, ela se misturava entre a iluminação do píer com a dos anzóis e a dos restaurantes que por ali ficavam.

- Que noite linda.
- Sim.
- E fria.
- Tome, use isto.

Coloquei minha camisa de flanela em seus ombros. Ela a vestiu, sorridente como sempre.

- Conseguiu voltar bem ontem?
- Sim, sim. Eu fiquei bem.
- Não me pareceu muito bem com isso.
- Sinceramente... Eu acabei dormindo na praia e só fui conseguir descansar quando fui para um motel hoje no fim da tarde.
- Você tá brincando comigo!
- Essas coisas também me surpreendem bastante.

Nos divertíamos com a minha habilidade de me envolver em algo estúpido, acabar bem e em um lugar desconhecido. Talvez fosse um dom.

Passeávamos pela causada de frente para a praia, passamos pela mesma livraria que fui mais cedo. Até que um mal encarnado nos abordou.

- Ei, amigão! Dá uma moeda “parcero”?

Parceiro? Essa era novidade pra mim.

- Desculpa cara, estamos apenas caminhando.
- Sem essa, dá um troco ai pô!
- Fica pra próxima.

Ela não devia estar acostumada com essa conversa, olhava para ele com uma expressão de desconforto em seu rosto.

- Dá um cigarro?
- Porra, eu já disse que não vou te dar nada!
- É foda, nego não sabe o que é passar fome.

Viramos as costas pra ele.

- SEU PLAYBOY DO CARALHO! Tá só querendo impressiona a vagabundo do teu lado!

O idiota me atingiu. Meu sangue subiu, meu peito ferveu, voltei para outra conversa.

Peguei ele pela gola da camisa, cheguei em seu ouvido e disse:

- Presta atenção seu merda, você já passou dos limites. Quer ajuda faça por merecer, não me venha com essa atitude arrogante e pior, não me faça chamar atenção, não dê um escândalo para todos nos olharem. O resultado disso pode ser uma boa surra, o que acha?
- Eu não tenho medo de um viadinho rico como você.

Apertei mais a camisa dele e engrossei o tom de voz.

- Você tem mais uma chance pra sumir da minha frente.

Ele continuava falando e falando, apenas ameaçando, tentando se mostrar firme. Mas fugiu com o rabo entre as pernas.
Tive de respirar fundo para me virar e encarar o rosto de Nathália após aquela cena toda. Acendi um cigarro enquanto caminhava em sua direção.

- Olha, me desc...
- Leo, não diga nada. – Ela segurava meus lábios com seu dedo – Ele fez por merecer, você apenas não conseguiu se conter. Não fiquei assustada.

Fiquei impressionado e aliviado com aquela atitude.

Continuamos nosso passeio, nos beijávamos cada vez mais, era possível sentir o calor de seu corpo. Já estava tarde, depois de alguns copos em um bar ela se soltou e voltou a me impressionar.

- Você me disse que depois de acordar na praia foi para algum lugar. Onde era?
- Fui para a livraria, demos um tempo na praia e depois me refresquei numa ducha em um motel aqui por perto.

Quanta ingenuidade para um escritor inspirado em Bukowski.

- Entendi... Que tal irmos para lá experimentar a tal ducha juntos?

Arregalei os olhos, levantei as sobrancelhas. Pedi a conta, fomos para seu carro com pressa, mal podíamos nos conter no caminho, ela e sua mão atrevida...