terça-feira, 15 de janeiro de 2013

Tudo Novo de Novo

Caminhávamos no parque, apenas eu e meu mais novo comparsa, Billy. Ele não parava, corria para todos os lados, ia atrás de outros cachorros para brincar, era um excelente meio para se fazer novas amizades, infalível. Era bom tê-lo por perto, minhas noites solitárias não haviam terminado graças a sua companhia, nem todos os pensamentos que circulam a infinidade da minha mente. Mas ele acrescentava algo diferente em minha cabeça, era um grande amigo.

- É seu cachorro?

Me virei para responder.

- Oi... Sim, sim é meu cachorro.

Meus olhos brilhavam diante dela. Falsa ruiva, olhos castanhos e um grande par de peitos me dando boas vindas.

- Ele é lindo e gosta de brincar.

Não é só ele...

- Ele é meio besta assim mesmo, mas é um ótimo cachorro.
- Uma graça.
- Desculpe, mas qual o seu nome? – Sorri pare ela.
- Nathália. – Devolvia o sorriso, mas desviava o olhar envergonhado. – E o seu?
- Leonard, muito prazer Nathália.
- O dia está lindo, é difícil ver alguém tirando um tempo para sair com seu cachorro como você está fazendo, ainda mais hoje as vésperas do ano novo.
- Não sou como os outros, aprecio as pequenas coisas que tenho. - Não é o meu forte usar meu “charme” sóbrio.
- Há há, você é uma graça também. Então, quais seus planos para essa noite?

Finalmente contato visual, agora o problema é que eu não sou bom em trocas de olhares prolongadas.

- Planos? Hm, não sei, não tenho planos, apenas deixo acontecer. Ficar em casa tomando algo enquanto escuto os fogos de artificio, algo do tipo pra começar.
- Mas só isso? Você não deve se privar assim, deveria sair com seus amigos, ou ficar com sua família.
- E o que você pretende fazer essa noite?
- Vou para a praia com umas amigas.
- Praia? Boa escolha.
- Sim, você deveria aparecer por lá. Vamos para Ilhabela.

Olhava para ela com uma expressão de quem aos poucos estava sendo convencido pelo convite. Um sorriso aos poucos saia pelo canto dos meus lábios.

- Tá legal, tentarei comparecer.

Ela me deu seu telefone, um beijo no rosto e deixando seu encanto foi embora para sua Ilhabela. Me abaixei, peguei Billy no colo e disse:

- Obrigado por tudo mais uma vez. Espere até ficar grande o suficiente para saber aonde toda essa sua energia vai te levar.

Passamos no mercado para comprar algumas garrafas de uísque, tequila e cachaça. Chegando em casa Arthur me abordou na porta do bar.

- Fala herói!
- Grande Arthur. Como estão as comemorações das festas?
- Excelentes meu velho! Sem esses bêbados caindo e cuspindo em mim, apenas eu e a patroa em casa curtindo nosso novo ar condicionado e uma bela taça de vinho.
- Esse é o cara.
- E você? Fiquei sabendo do seu novo amigo ai.

Billy brincava ao redor de um formigueiro.

- Estou apreciando meus minutos de vida.
- Bom vê-lo de pé e longe daquele hospital.
- Nem me fale.
- Bom, eu preciso ir, até a próxima rodada aqui no bar. Feliz ano novo!
- Feliz ano novo Art.

Subimos, servi uma bela dose de água para Billy e para mim uísque puro. Comecei a escrever fumando um cigarro de palha, maus hábitos de um velho amigo de ouro preto. O telefone tocou.

- Sim?
- Leonard, seu desgraçado! O que está aprontando?
- Alex? Estou trabalhando, por que? O que você fez dessa vez?
- Planejei algo melhor do que ficar enchendo a cara sozinho em casa durante a virada de ano. Nós vamos para a praia curtir como nos velhos tempos.

Ele estava certo, eu odiava praias. Mas não era apenas por ser um lugar quente, cheio de gente suada onde o mar estava provavelmente sujo e contaminado. Desde que ela se foi eu odiava a ideia de voltar para esse tipo de lugar, as lembranças eram sempre muito fortes e doloridas. A saudade é um sentimento muito forte quando misturada com a dor da perda.

- Como é?
- Eu sei que você não gosta de praia, mas é o que nós conseguimos pensar aqui.
- Nós quem?
- Noel, Ana e eu.

Lembrei-me de Nathália e de seu convite. Sorri pela oportunidade.

- Eu tive uma ideia. – Continuava sorrindo.

Exatos cinco minutos depois de desligar o telefone eles estavam lá embaixo buzinando e gritando meu nome. Os desgraçados não tinham em mente a possibilidade de eu não ir, era sempre assim, eram os únicos que de um jeito ou de outro conseguiam me tirar da fossa.

- Lá vem ele!
- Leo! Vem me dar amor e carinho seu barbudo lindo! – Se declarava Noel.

Ana apenas ria das bobagens ditas pelos dois enquanto ligava o carro.

- Tem espaço para um amigo meu ai?
- Amigo? Porra, antes você sempre trazia uma “amiga” diferente. – Disse Alex.

Mostrei Billy para eles.

- Meu deus! Mais que fofo! – Disse Ana com um lindo sorriso em seu rosto.

Pé na estrada, prontos para uma noite até então fadada a ser memorável. Billy se divertia com o bobalhão Alex, parecia que ele sabia da falta de seriedade de seu novo amigo. O casal se acariciava no banco da frente, Noel é claro, tentando distrair Ana com suas passadas de mão nas pernas cobertas por uma saia fina. Eu apenas sorria enquanto fumava e tentava aceitar minha nova maneira de passar certas datas comemorativas.

Eu adorava ser passageiro do “expresso Ana”, as conversas sempre me faziam dar risadas, a maioria das vezes eram risadas voltadas para mim mesmo, e a música sempre me agradava, agradava tanto que me deixavam mais pensativo do que o de costume.

- Muita coisa mudando na sua vida, não é Leo? – Comentou Ana.
- É, mal sai do hospital e já me enfiei em outra louca, em outra briga de bar e já estou bem acompanhado de novo.
- Mas que porra você tem pra arranjar tanta confusão? – Disse Noel.
- O Leo sempre foi assim, não pode ver uma buceta que já fica correndo atrás. – Disse Alex.
- E uma briga então... Há há. – Completou Noel.
- Essa é minha sina, o que eu posso fazer? Entrar pra igreja?
- Mas quem é essa boa companhia? Outro rabo de saia? – Perguntou Ana.
- Rabo de saia? Sempre pensei que eu tivesse bom gosto.
- Pra loucas e confusões, sim.
- Obrigado mesmo pessoal. Minha companhia é ele, Billy.
- Viro papai, há há há! – Maldito Alex.
- Como você está no novo emprego Ana?
- Você está muito bem informado hein. Muito feliz! É ótimo poder mandar e ser ouvida pra variar.

Todos nós olhamos para Noel.

- Mas ser uma das mandachuvas de uma revista, até mesmo se ela não for uma das três tops do país ou do estado, não é moleza. Cobram tudo de mim, até se um peão chegar atrasado.
- Quem mandou querer o controle das coisas. – Disse Alex.
- De onde você tirou essa ideia de ir pra Ilhabela Leo? – Perguntou Noel.
- Mais tarde vocês entenderam.
- É, to sabendo já. – Disse Alex, que sendo meu melhor amigo, realmente sabia o motivo.

Estávamos na balsa atravessando o mar para chegar até a ilha. Descemos e deixamos Billy no carro, por sorte ele estava dormindo, o pequeno gremlin daria um grande trabalho próximo ao mar.

- Nossa amor, é tão lindo.
- Sim, gatinha, é uma graça, como você.

Alex e eu fomos para o canto fumar e observar o mar.

- Eae, como você tá lindando?
- Com o que?
- Você sabe cara.

Não sabia do que ele estava falando.

- Hm... Eu to ótimo cara, relaxa.
- Então tá. Agora olha lá, a praia tá cheia de variedades pra você seu tarado. Até as gordinhas. Olha, e só de biquíni.
- Alex.
- Que?
- Cala a boca.

Rimos, terminamos nossos cigarros e voltamos para o carro. Apesar do rancor, eu adorava e temia o mar.

Fomos direto para a areia, quer dizer, eles foram, eu fiquei em um quiosque por alguns minutos me preparando. Usava uma bermuda, coisa rara de acontecer, e é claro, minha camisa de flanela favorita, os óculos escuros completavam o pacote.

- Ei, me trás uma dose de cachaça.
- Nós não temos cachaça aqui.
- Vocês fazem caipirinha?
- Sim, claro.
- Com cachaça ou vodca?
- O que o senhor preferir. Vai querer uma?
- Não, obrigado. Mas vou querer a cachaça que você usaria para fazer a caipirinha.

Ele me olhou sem saber o que dizer. Era um idiota.

- Mas não vendemos só cachaça.
- Cara, eu te pago cinco reais se me der um copo desses de 300 ml cheio de cachaça, que tal?

Pronto, resolvido o meu problema com a areia e com o sol. Fui me sentar junto a eles para me proteger de baixo de um guarda sol.

- Caramba, foi uma ótima ideia vir pra cá. – Exclamou Ana.
- Vamos pro mar! – Sugeriu Noel.
- Demoro, vamos logo por que tá um puta calor.

Então os três foram correndo para o mar. Eu fiquei com o meu mar de cachaça bem preservado dentro de um copo de plástico. Acendi um cigarro e estava ótimo assim. Billy continuava dormindo, mas dessa vez em meu colo.

A noite chegava. As únicas vezes em que eu me levantei foram para ir ao banheiro e para dar um rápido passeio com Billy na calçada.

- Minha nossa, essa tarde foi ótima.
- Porra, e agora? A gente vai passar o ano novo molhado? – Perguntou Alex.
- Eu tenho toalhas no carro e roupas secas, podemos nos secar lá e então irmos comer em algum lugar. – Disse Ana.

Fomos para um restaurante. Ele era todo pintado de verde, algumas mesas e cadeiras ficavam na parte de fora e a o local parecia ser um casarão antigo, porém bem preservado e é claro, caro.

- Que lugar fofo.
- Vamos comer logo, eu tô morto de fome. – Exclamou Alex.
- Por favor! – Suplicou Noel.

Nos sentamos e pedimos nossas refeições acompanhadas de uma bela garrafa de vinho do porto, afinal era uma data para se comemorar algo, certo?

- Ááá eu comi demais! – Disse Alex.
- Parece que vai estourar meu cinto. – Disse Noel.
- Eu duvido que seja por causa da comida. – Ana sorria olhando para os lábios de Noel.

Já passava das nove horas, decidimos ir para a praia novamente. Coloquei então meu plano para ir até lá em prática. Liguei para Nathália.

- Alô?
- Oi, Nathália?
- Sim.
- Sou eu, Leonard.
- Olá! – Sua voz parecia surpresa e contente com minha ligação.
- Estou aqui.
- Na ilha?
- Sim, vim com alguns amigos.
- Jura? Nossa, eu e minhas amigas estamos na praia do Engenho d’Água, fica perto da Vila. Estaremos perto do mar, somos cinco meninas e três caras que conhecemos aqui.
- Ótimo, estamos indo.

Após um belo passeio pelo transito cheio de luzes piscando e pessoas gritando, chegamos à maldita praia. Não fazia ideia de como encontrar ela, todos ao redor eram iguais para mim bêbado daquele jeito. Eram apenas pontinhos brancos com camisas brancas falando bobagens em alto som.

Parei um minuto para observar o mar que brilhava diante dos meus olhos. A lua estava escondida atrás de tantos fogos que se multiplicavam e mudavam de cor. As pessoas sorriam de forma diferente, sem motivo aparente, eram tomadas pelo momento. Todos se abraçando, desejando felicidades, simpatizando umas com as outras apenas por estarem próximas de baixo dos fogos no céu, agora tomado pela luz.

- Feliz ano novo!
- Passamos por mais um seu bêbado!
- Eu te amo, Noel!

Olhei para Billy, ele se assustou no começo, mas logo entrou na festa. Sorria olhando em seus pequenos olhos pretos.

- Feliz ano novo companheiro.

Depois de tantos abraços e brindes, era chegada a hora de libertar novamente o alcoólatra que compunha minha personalidade. Abracei desconhecidos, bebi de suas garrafas, até chegar perto de uma mulher, aparentemente 57 anos de idade. Ela tirava fotos, estava sozinha, foi o que pensei. Eu a abracei e com carinho a beijei rapidamente, ela apenas sorriu sem jeito. O mundo não é feito apenas de rosas, é preciso regar muita samambaia nessa vida.

- Leo! Você veio!

Olhei para trás. Seu cabelo ruivo brilhava com as luzes que continuavam piscando no céu.

- Que lindo sorriso.
- Seu bobo.

É engraçado como surge certa intimidade entre duas pessoas que mesmo acabando de se conhecer parecem ser grandes amigos, ou até mais do que isso.

Ela me abraçou forte.

- Feliz ano novo.

Eu a beijei (por mais tempo e com mais vontade do que a moça dos 50 e poucos anos.)

- Para você também. Feliz ano novo para todos nós!

Nossos grupos se juntaram, assim como nossas bebidas. Todos passaram do ponto naquela noite. Nathália e eu ficamos juntos conversando, bebendo e caminhando na beira do mar. Noel e Ana ficaram com Billy, Alex não deixou seus instintos falharem e aproveitou a oportunidade com outra garota bêbada. Ao longo da noite a lua apareceu para nos saudar em outro ano cheio de novas batalhas a serem enfrentadas e garrafas a serem abertas.

sexta-feira, 4 de janeiro de 2013

Magia de Natal

Acordei com o som da chuva forte batendo na janela. Morfina não estava ao meu lado, já tinha saído para trabalhar. Levantei, cocei, peguei um cigarro no criado mudo e fui me aliviar. Depois fui até a cozinha pegar um copo d’água, sentei para ler o jornal e encontrei um bilhete em cima da mesa, era de Morfina:

“Bom dia querido, espero que não esteja novamente de ressaca. A noite passada foi realmente muito divertida e memorável, foi incrível estar com você e acordar ao seu lado. Mas preciso ser sincera... Depois do que conversamos e de ver as marcas em seu rosto hoje cedo, não pude evitar repensar minha vida. Você estava certo, meu passado é um enorme circulo de problemas, principalmente meus últimos relacionamentos e eu não quero te envolver nisso. Infelizmente sei que preciso fazer isso. Não podemos continuar juntos, espero que me entenda.

Obs: Ainda quero outra noite ao seu lado. Beijos, sua Morfina.”.


Eu entendia o que ela queria para si, sabia que estava fazendo a coisa certa e fiquei feliz por Morfie. Sentiria saudades daquelas pernas macias sobre mim. Fiz um café para acompanhar outro cigarro. Juntei minhas coisas, terminei meu café e sai, ainda chovia, mas não me incomodava, apenas seguia meu caminho.

A chuva começava a apertar cada vez mais, continuava não me incomodando, mas não haviam condições de chegar em casa daquele jeito. Então fui ao shopping, o primeiro lugar que encontrei para me distrair.

- Com licença senhor. – O segurança se direcionou a mim.
- Sim? É comigo?
- Sim, senhor. Não é permitida a entrada de bebidas alcoólicas no estabelecimento. Eu vou ter de pedir para o senhor jogar fora a sua cerveja se for entrar no shopping.

Eu tinha comprado umas latas de cerveja depois que sai da casa de Morfina.

- Jogar fora? Não seja por isso. – Virei à metade que faltava da lata, depois a joguei no lixo. - Pronto.
- Uau! Bom, obrigado e desculpe pelo incomodo.
- Tudo certo chefe.

Há um bom tempo não ia a um shopping, sempre me perdia e tinha a sensação de ser o único estranho no local. Talvez fosse a barba, apesar de nunca me sentir mal pela minha preciosa. Eu era indiferente, as pessoas são sempre cheias de frescuras em lugares com muita “exposição”, na verdade eu me sentia bem sendo diferente de certos babacas.

Dentro de um shopping não há o que fazer nunca, a não ser gastar dinheiro que não temos em comida, roupas ou em um cinema. Eu sempre ia direto para a livraria. Gostava do ambiente, o cheiro dos livros novos é algo sempre agradável, novos livros são sempre bem vindos afinal de contas.

Fui cumprimentar velhos conhecidos da LP&M pocket, sou colecionador fiel dos livros da LP&M. Porém, me deparei com um livro que não havia encontrado antes. Sua capa me chamava atenção por ter três homens de roupas gastas, um deles com uma lata de lixo na mão e o outro ajudando o terceiro a acender uma ponta de cigarro. Sempre me interessava por livros com “vagabundos”. O nome era “Na pior em Paris e Londres” de George Orwell. Peguei.

Conhecia pouco sobre George, apesar de ter algum livro perdido em casa e meu pai também ter, não me lembrava de seus textos claramente, apenas de um clássico: "Revolução dos Bichos". Decidi redescobri-lo, por que não dar uma chance a um novo livro? Gostaria que todos pensassem assim quando vissem meu nome na capa de um livro jogado nos cantos de alguma livraria...

Passei algumas horas me divertindo no recinto antes de pegar a fila para comprar meu novo achado. Na fila, outra surpresa. Reconheci uma mulher de cabelos castanhos. Era uma amiga de outras épocas, Marina.

Fiquei em dúvida se deveria aborda-la, mas antes de concluir meu pensamento, ela se virou e veio em minha direção.

- Leo! Meu deus, quanto tempo.
- Oi Mari. Sim, muito... Você está diferente, cortou o cabelo, parece mais sorridente. Está ótima.
- Você dizendo de mim? Já viu o tamanho da sua barba? Linda!

Marina sempre foi diferente das outras nesse sentido, ela não se importava com a aparência física como muitas pessoas. Ela simplesmente gostava de boas conversas, boas companhias e uma boa garrafa de vinho.

- Veio fazer compras para o natal? Está meio em cima da hora, hein.
- Natal?
- Leo, hoje é dia 24 de Dezembro.
- Puta merda! Serio? Nossa, eu ando meio perdido depois que sai do hospital...
- HOSPITAL? O que aconteceu?
- Nada. - Saiu sem querer.
- Como assim?
- Eu fiz trabalho voluntário em um hospital recentemente. Me sentia sensibilizado pelos deficientes.
- Conta outra.

Ela sorria o tempo inteiro, parecia viva por dentro e por fora.

- Você está linda.
- Obrigada, você continua com esse seu jeitinho.

Não há como esconder, é sempre bom rever uma ex-namorada, quer dizer, quando no fim do relacionamento não houve brigas, choros e garrafas pelo ar, então sim, é sempre bom. Surge um sentimento de saudade que não havia antes quando não há contato. A melhor parte é que esse sentimento é reciproco.

- Se você nem lembrava que era natal, pelo jeito não tem planos, certo?
- Nada.
- Que tal mais tarde eu te ligar para tomarmos um vinho?
- Vinho, sempre vinho. Claro!

Passei meu telefone para ela.

- Eu preciso ir agora, tenho de encontrar minha mãe para dar um beijo e toda aquela baboseira. Eu te ligo mais tarde Leozinho.

Sorrisos.

- Ótimo.

Dei um leve beijo em seus lábios. Ela se foi.

Ainda chovia forte, mas a chuva dava sinais de que logo iria parar e eu finalmente poderia voltar para meu lar. Caminhei pela ultima vez antes de ir embora. No centro do maior salão do shopping tinha uma casa com detalhes vermelhos e verdes, falsa neve em volta, mulheres lindas vestidas com roupas nos mesmos detalhes da casa e um velho gordo de barba branca e cara de tarado sentado em uma cadeira.

- MAMÃE ELE APERTO MINHA PERNA E SUBIU!
- O QUE?! SEGURANÇA! SEGURANÇA!
- É mentira desse moleque! Tire suas mãos de mim seu filho da puta!
- Levem esse palhaço daqui agora! Francisco chama o substituto!

Entrei em uma loja de animais.

Olhei em volta, todos os pais e as crianças mimadas rodeavam os cachorros de puro sangue, os pássaros mais coloridos, os peixes de três cores e os gatos gordos. No canto da loja encontrei um bicho diferente. Ele era inteiramente preto, apenas uma pequena mancha branca no peito. A orelha machucada no meio, o olho esquerdo fechado, ele não enxergava com aquele olho. Mas algo havia nele, dentro de seu único olho bom era possível ver alegria de um jovem cachorrinho louco por diversão e amor, era tudo que ele queria da vida.

- Ei, o que há de errado com ele pra deixa-lo de canto? – Perguntei.
- Não vê? Ele está todo machucado para um filhote, é o único que não foi adotado ainda.

Meu sangue subiu, eu estava pronto para quebrar aquele cara no meio.

- Eu vou levar ele.
- O senhor pode ver aqueles ali da frente, estão em bom estado e com bom preço.
- Eu disse que vou levar ele.
- Mas...
- Mas é uma porra, eu já disse que quero levar ele! E outra coisa, não me venha com essa de “bom estado”, eu vejo essas espinhas na sua cara e não digo que você está arregaçado demais para entrar em um lugar como esse. Agora me da a merda da ficha pra eu assinar e levar o meu cachorro.
- É... Eu... Quer dizer, sim, claro.

As crianças me olhavam como o papai noel malvado, seus pais não acreditavam no que ouviram. Assinei a papelada, não paguei um centavo por que ele estava “mal” para por algum preço. Filhos das putas!

Finalmente estava em casa, ainda passei em um supermercado para comprar comida para o bicho e cerveja para o dono. Logo de cara o pequenino se encontrou em nosso aconchego e em minha cama. Bom, seu rosto sorridente facilitou as coisas para dividirmos minha cama.

- Seu safado, vou te chamar de Billy.

Ele me mordia, lambia minha mão, abanava o rabo, estava feliz finalmente. Maldita mania dos cachorros em me morder por diversão, deve ser a minha cara de taxo que passa essa expressão de mordedor.

Era bom tê-lo ali comigo, era um motivo para voltar para casa todas as noites com um sorriso.

Os fogos começaram, afinal, de quem foi à ideia de atear fogo no céu por causa do natal? Querem matar o velho para ficar com todos os presentes?

Billy ficou agitado, dei sua refeição natalina, abri a minha lata de natal acompanhada de uma bela garrafa de uísque, então começamos a celebração de outro dia para estarmos vivos.

Quase duas horas depois, Marina me ligou, disse que estaria vindo para minha casa com sua garrafa de vinho. Essa sim era a verdadeira magia natalina!